domingo, 20 de março de 2011

Fichamento 1


Interdisciplinaridade e integração dos saberes
POMBO, Olga. Interdisciplinaridade e integração dos saberes. LIINC em Revista, v.1, n.1, 2005, p.3-15. Disponível em http://www.ibict.br/liinc. Acesso em 17.03.2011.

O artigo é fruto de uma conferência que a autora ministrou no Congresso Luso-Brasileiro sobre Epistemologia e Interdisciplinaridade na Pós-Graduação, realizado em Porto Alegre (Brasil) em junho de 2004. O tema do trabalho é compreender a questão da interdisciplinaridade tanto na investigação científica quanto no ensino das ciências na atualidade.
Pontos mais importantes apontados ao longo do texto:
1. Além de afirmar que não sabe o que é nem como se faz interdisciplinaridade, a autora arrisca dizer que ninguém sabe como se faz, pois a interdisciplinaridade não é qualquer coisa que se faça, mas algo que está a acontecer para além da nossa vontade. Ela defende que sua tentativa será fazer seu público entender um pouco do que se pensa sobre interdisciplinaridade e por que ninguém sabe como ela se faz e o que ela é exatamente;
2. Para começar, Pombo trabalha os conceitos de multi, pluri, inter e transdisciplinaridade, demonstrando suas semelhanças e seus distanciamentos. Segundo ela, esses conceitos seguem em um continuum de desenvolvimento, da ideia de convivência entre muitas disciplinas – multi ou pluri -, para a ideia de colocá-las em relação umas com as outras – inter -, até a ideia trazida pelo prefixo trans, de ir além das disciplinas, ou, nas palavras da autora, “uma ultrapassagem daquilo que é próprio da disciplina” (p.5). De qualquer modo, todos esses conceitos carregam em si, segundo ela, “uma tentativa de romper o carácter estanque das disciplinas” (p.5). A interdisciplinaridade estaria, portanto, em uma situação intermediária, entre a simples justaposição e a ultrapassagem/fusão entre elas;
3. O fundamental, para a autora, é compreender o que está por trás dessas várias palavras, que é a resistência da atividade científica ao processo de especialização que vem se fortalecendo a partir do século XIX, com o advento da ciência moderna, baseada nas metodologias propostas por Descartes e Galileu. A especialização que tem caracterizado o procedimento científico desde sempre é, segundo Pombo, essa metodologia que permite “ ‘esquartejar’ cada totalidade, cindir o todo em pequenas partes por intermédio de uma análise cada vez mais fina” (p.6), acreditando que, ao final do processo, poderá recompor o todo por meio da soma das partes;
4. Pombo explica que há, certamente, as vantagens relacionadas a essa concepção da ciência, demonstradas por todos os resultados notáveis trazidos para a vida do homem contemporâneo. Mas, no entendimento da autora, é necessário reconhecer os custos da especialização, que a autora elenca em seguida:
4.1. Custos relativos ao próprio especialista, que se converte em um ser que sabe cada vez mais sobre cada vez menos, ao lado da separação e da incompreensão profunda entre duas formas da cultura científica: ciências da natureza e ciências do espírito, que deixam de comunicar entre si;
4.2. Custos do ponto de vista institucional, a saber, a competitividade entre comunidades de pares, que disputam entre si os apoios, financiamentos, bolsas, equipamentos etc. Uma das conseqüências dessa disputa é a patentificação de novas áreas de investigação, que, segundo Pombo, “ameaça destruir a nossa própria ideia de ciência” (p.8), pois dificulta ou mesmo inviabiliza as descobertas simultâneas e “o carácter público, universal e desinteressado da ciência” (p.9);
4.3. Para a autora, além dos custos culturais e institucionais da especialização, há ainda outros tipos de custos, como a questão da heurística: paradoxalmente, em paralelo ao processo de especialização vivido pela ciência, as descobertas científicas e o progresso da ciência estão cada vez mais atrelados à fecundação de umas disciplinas por outras, pela “transferência de conceitos, problemas e métodos – numa palavra, do cruzamento interdisciplinar” (p.9). O que vivemos hoje, nas palavras de Pombo, “é como se o próprio mundo resistisse ao seu retalhamento disciplinar” (p.9). Segundo Pombo, de acordo com alguns autores, como Durand (1991), a criação científica sempre esteve ligada à interdisciplinaridade;
5. Por tudo o que foi dito antes, a autora acredita que uma das chaves fundamentais para o entendimento da questão é considerar que o todo não é igual à soma das partes. Segundo ela, a especialização precisa ser complementada ou mesmo substituída por uma visão interdisciplinar, que pode ser capaz de abarcar as configurações e perspectivas múltiplas que a ciência necessita convocar para o conhecimento de seus objetos de estudo. Nessa nova perspectiva epistemológica, Pombo observa o surgimento de ciências de fronteira, interdisciplinas e mesmo interciências, combinações que visam resolver problemas precisos, que fogem à alçada das disciplinas tradicionais. Sim, pois a autora aborda também o surgimento não apenas de novas práticas de investigação interdisciplinar, mas de novos problemas, complexos, impossíveis de serem pensados sem lançar mão de uma enormidade de variáveis que nenhuma disciplina sozinha está apta a resolver. Disso, para ela, decorrem duas conseqüências: “o alargamento do conceito de ciência e a necessidade de reorganização das estruturas da aprendizagem das ciências, nomeadamente, a universidade;
5.1. Sobre o alargamento da ciência, a autora defende que, desde o início do século XX, a ciência entrou em um processo de perda da autonomia, passando a ser, cada vez mais, sobretudo a partir da 2ª Guerra Mundial, afetada por aspectos de natureza política e econômica; ao mesmo tempo, a ciência passou a contaminar e estar presente em todas as instâncias da vida humana, fazendo parte de nosso cotidiano;
5.2. Em razão desse apagamento de fronteiras entre ciência e política, economia, arte e vida, surge uma nova situação, a de um público mais informado, que passa a se interessar, a criticar e a exigir mais; o que aponta para uma remodelação da Universidade, um espaço de investigação mas também de formação;
6. O lugar da Universidade: polo de investigação e local de formação
6.1. Pombo salienta que, como polo de investigação, ela terá de acompanhar as transformações pelas quais passa a ciência contemporânea, adotando e apoiando as exigências interdisciplinares que atravessam a construção dos conhecimentos;
6.2. Como escola, local de formação, ela tem de estar apta a preparar para a interdisciplinaridade e não apenas apoiar, mas promover experiências que se debrucem sobre novos tipos de configurações disciplinares. Como afirma Pombo, “criar oportunidades sérias para pensar o que está a acontecer, tanto na esfera da produção, como na da transmissão do conhecimento” (p.13).
Conclusões: Por fim, a autora afirma que a interdisciplinaridade não se deixa pensar apenas em sua faceta cognitiva, pela sensibilidade à complexidade, mas exige uma atitude concreta de curiosidade, abertura e gosto pelo trabalho em comum. Nas palavras dela, “sem interesse real por aquilo que o outro tem para dizer não se faz interdisciplinaridade” (p.13). É preciso ter coragem para adentrar esse domínio que é de todos, esse “estar entre” que não pertence a ninguém em particular.

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